9º Congresso Nacional da Rede Unida 2010
Resumo:162-1



162-1O que podem as palavras no cotidiano de uma instituição psiquiátrica
Autores:Regina Longaray Jaeger (UFRGS - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)

Resumo

Nos propomos a conversar sobre nossas práticas psi mais cotidianas a partir dos encontros com a escrita e com uma usuária internada há mais de 25 anos num hospital psiquiátrico. O ponto de partida da pesquisa foi o contato inicial com seus escritos que dizem das forças maquínicas do qual fazemos parte, provocando nossas práticas. Trazemos a experiência destes encontros da terapeuta/pesquisadora com uma usuária/escritora como estratégias clínicas que nos auxiliem a desestabilizar nosso cotidiano, nossas verdades estruturadas em saberes retroativos. Operamos nossas falas e escutas num plano coletivo da expressão de múltiplas matérias, que se dão a partir da materialidade dos encontros dos corpos e exprimem as forças dos corpos afetados, a potência de existir. As palavras mais cotidianas ao serem emitidas, incidem na realidade e tanto podem privilegiar o mesmo estado de coisas, da relação paralisadora manicomial, quanto podem rachar este estado de coisas, abrindo para forças outras. Apoiados em Deleuze, Foucault entre outros, tomamos a palavra como um elemento de expressão de fluxos que fazem parte de agenciamentos coletivos. A palavra expressa um determinado saber e exerce um poder real sobre o usuário, diz de um maquinismo de produção concreto de realidades que podem expandir ou comprimir os fluxos da vida. Um usuário é um agenciamento que faz parte de outros agenciamentos que funcionam conjugados ao grande agenciamento da loucura. Cada movimento, cada gesto, cada expressão seu é destacado, recortado por um grande maquinismo chamado “loucura”. Cartografar, no sentido proposto por Deleuze e Guattari, consiste em seguir os traçados dos devires. Graus de potência de afetarmos e de sermos afetados se realizam nos encontros com as diferentes matérias do universo hospitalar. Sem caminhos a priori, buscamos nos conduzir pela experiência que se abria a novas problematizações, privilegiamos as tensões que nos instigavam a pensar, a nos mover, a fazer novas perguntas. Fazemos parte de uma máquina abstrata da loucura, somos elementos concretos que se atualizam pela potência maior ou menor de transformação do agenciamento, para se rebater sobre o agenciamento ou desterritorializá-lo. A saturação dos saberes psi que patologizaram as palavras nos deixaram ensurdecidos e insensíveis aos movimentos mais sutis dos corpos hospitalares. Trata-se afiar nossas escutas e sensibilidades para apreendermos a expressão dos corpos em movimentos.


Palavras-chave:  CARTOGRAFIA, LINGUAGEM, CLÍNICA TRANSDISCIPLINAR